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Mostrando postagens de 2025

O ensino da gramática e o chamado preconceito linguístico

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  Dr. Marco Antônio Bomfoco*      A correção linguística e a adesão a normas objetivas não devem ser vistas como formas de preconceito, mas como elementos essenciais para evitar ambiguidades e garantir clareza na comunicação. A pressuposição de que a norma padrão é necessariamente a linguagem da elite privilegiada social e culturalmente é, na verdade, uma ideia prejudicial e autodestrutiva. É descabida a atitude de condenar a norma padrão sob a alegação de que ela restringe a diversidade linguística, pois isso desconsidera a capacidade natural dos falantes de alternarem entre diferentes modalidades linguísticas conforme o contexto, uma habilidade que o gramático Evanildo Bechara descreve como ser “poliglota na própria língua”. Sem uma variedade formal, como poderia o cidadão participar efetivamente do discurso público? O objetivo da norma padrão é proporcionar uma base comum para aprender e para discutir questões e problemas relevantes. Por outro lado, a fala coloqui...

Indução e Intuição na teoria do conhecimento: Kant, Husserl e Bergson

                                                                             Dr. Marco Antônio Bomfoco Na teoria do conhecimento, “indução” e “intuição” são termos que, embora por vezes se cruzem no uso coloquial, designam processos profundamente distintos. A indução é um método inferencial; a intuição, uma forma de apreensão imediata. Essa distinção fica ainda mais evidente quando observamos como três pensadores — Kant, Husserl e Bergson — conceberam esses conceitos. Indução e dedução Na tradição filosófica, costuma-se distinguir entre indução e dedução . A indução é um procedimento a posteriori , pois depende da experiência: parte de casos particulares para formular leis gerais. Já a dedução é um raciocínio a priori , que se apoia apenas na relação necess...

Marx, O Capital e o limite da crítica ao Socialismo Utópico

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       Prof. Dr. Marco Antônio Bomfoco Quando Karl Marx publicou O Capital em 1867, seu alvo era claro: dissecar a mecânica do capitalismo, expor suas contradições internas e demonstrar como ele carregava, em si, as sementes de sua própria destruição. Nada de imaginar sociedades perfeitas; Marx queria um diagnóstico “científico” da realidade. Nessa postura, afastou-se do socialismo utópico de Saint-Simon, Fourier e Robert Owen, que projetavam comunidades ideais baseadas na cooperação e na harmonia social. Para Marx, esses visionários eram bem-intencionados, mas ingênuos: ignoravam o papel central da luta de classes e apostavam mais na moralidade que na história concreta. Contudo, ao rejeitar o utopismo, Marx também criou o seu próprio ponto cego. Ao apostar que as contradições do capitalismo conduziriam inevitavelmente ao socialismo, subestimou o peso de fatores imprevisíveis - culturais, políticos, psicológicos - que podem manter sistemas injustos funcionando p...

Conflito nos Céus: A dimensão espiritual na Bíblia

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  Prof. Dr. Marco Antônio Bomfoco      A Bíblia apresenta uma cosmologia que vai além do visível, descrevendo uma realidade espiritual organizada em diferentes “céus” e marcada por conflitos invisíveis. Essa visão é perceptível em livros proféticos e apostólicos, onde se delineia uma geografia espiritual que inclui o céu físico ou visível (a abóboda do firmamento, a atmosfera terrestre), um espaço intermediário de conflito espiritual (o céu espiritual invisível para os seres humanos, onde estão as potestades e principados) e o trono ou morada de Deus (no terceiro céu).      Em Daniel 10:12–13 , o profeta relata a visita de um mensageiro celestial que, embora despachado por Deus no primeiro dia da oração, demorou vinte e um dias para chegar devido à oposição do “príncipe do reino da Pérsia”. Esse personagem, identificado por muitos intérpretes como uma entidade espiritual hostil, representa forças demoníacas que exercem influência sobre regiões e povo...

A escola e o ensino da norma culta

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  Prof. Dr. Marco Antônio Bomfoco       A educação brasileira deteriorou a tal ponto que a gramática do vernáculo não é mais ensinada.  A escola tem a responsabilidade de ensinar a norma culta, também chamada de língua padrão, não como uma imposição arbitrária, mas como uma competência prática que capacita os alunos a se comunicarem em diversos contextos, especialmente os que exigem formalidade. Esse ensino não exclui a importância das variações linguísticas, ou seja, das regras que regem outros níveis de uso da língua; ao contrário, assegura que todos os alunos estejam capacitados a se comunicar com eficácia em situações que demandam formalidade e precisão. O aluno de português, ciente das diversas variedades e registros da língua, torna-se capaz de escolher as variedades adequadas para a sua intenção comunicativa, tanto na fala quanto na escrita. Assim, a escola respeita a diversidade linguística, ao mesmo tempo em que capacita os alunos a transitarem por vari...

Velhos erros na nova resolução do CNE - 2025

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  Prof. Dr. Marco Antônio Bomfoco A Resolução nº 04/2025 do Conselho Nacional de Educação amplia o controle federal e impõe uma única forma de pensar a educação.  Os nossos burocratas desconhecem que o problema não está na modificação dos currículos, mas na modificação dos métodos de ensino.  Ao sufocar o pluralismo pedagógico, a nova resolução aprofunda erros estruturais e fere a liberdade educacional. De 2000 a 2022, o Brasil amarga os últimos lugares no conceituado exame do PISA, coordenado pela OCDE, sem que os sucessivos governos corrijam o rumo. A cada edição surgem promessas, mas o velho modelo resiste. Esse mesmo modelo foi agora ratificado pela nova resolução do CNE.  A situação catastrófica do ensino médio não vem da falta de recursos, mas da persistência de um modelo ideológico que prioriza metas vagas — como “qualidade social” — em vez de indicadores claros e mensuráveis. A raiz do impasse está na fundamentação teórica do processo educativo. Hoje,...

Lutero não fez uma Revolução - E isso importa!

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Prof. Dr. Marco Antônio Bomfoco    Por séculos, aprendemos que Martinho Lutero “iniciou a Reforma Protestante” - um marco frequentemente rotulado de revolução religiosa. De fato, há quem insista que Lutero foi um revolucionário, desejando, certamente, destruir o grande homem da fé. Mas será que Lutero desencadeou mesmo uma revolução? O uso indiscriminado dessa palavra tem distorcido nossa compreensão histórica.    Uma revolução de verdade exige mais do que impacto: pressupõe preparo ideológico, mobilização social e um projeto de mudança deliberado. Veja a Revolução Francesa, que contou com os iluministas como arquitetos intelectuais, ou a Revolução Russa, fruto do marxismo e de anos de organização operária.    Já Lutero, quando afixou suas 95 Teses em 1517, não buscava uma ruptura. Ele queria discutir práticas da Igreja, especialmente a venda de indulgências. Não havia um movimento protestante pré-estabelecido, nem um plano claro de substituição do siste...

Os reis magos visitaram Jesus em Belém?

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Dr. Marco Antônio Bomfoco        A narrativa do nascimento de Jesus possui profundo significado religioso e espiritual para cristãos em todo o mundo. A cena do menino na manjedoura tornou-se um símbolo universal de esperança, humildade e do poder de um começo simples. O recenseamento romano, uma realidade histórica, estabelece o cenário para a viagem de José e Maria a Belém. O contexto cultural e político da época molda a narrativa, ressaltando o cuidadoso enraizamento histórico dos Evangelhos.        Desvendar o pano de fundo histórico do encontro dos magos com Jesus em Belém, contudo, revela uma narrativa mais complexa. A história do nascimento, profundamente enraizada na tradição cristã, serve como um portal para as dimensões históricas e espirituais dos acontecimentos.        Algumas pessoas ainda acreditam que os magos vindos do oriente encontraram o recém-nascido Jesus em Belém da Judeia. No entanto, esse relato corres...
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         Por que os Concertos de Brandenburgo ainda fascinam após três séculos?                                                                            Por Marco Antônio Bomfoco*                        Os  Concertos de Brandenburgo , compostos por Johann Sebastian Bach entre 1718 e 1721 e dedicados ao marquês Christian Ludwig de Brandenburg, estão entre as mais extraordinárias realizações da música barroca. Sua excepcionalidade repousa sobre diversos pilares artísticos e estruturais que continuam a fascinar estudiosos, músicos e ouvintes.              Em primeiro lugar, a obra representa o auge da forma  c...

Encontro com a poesia de Mário Quintana - Notas para estudo

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       Encontro com a poesia de Mário Quintana “As grandes alegrias provêm da contemplação das belas obras.” (Demócrito de Abdera) Tópicos  O poeta.  O percurso poético: obras principais.  Panorama da literatura da época.  Temas e características.  Leitura e análise: soneto “Matinal” (1989). O poeta A biografia de Mário Quintana - poeta, cronista, tradutor, jornalista - revela a dedicação de uma vida inteira voltada às letras.  1906 - Nasce em Alegrete, 30 de julho, Mário de Miranda Quintana. Quintana tem três irmãos: Milton (mais velho), Marietta e Celso (caçula, que falece aos 6 anos).  1919 – É matriculado no Colégio Militar - Porto Alegre (interno).  1924 – Emprega-se na Livraria do Globo, trabalhando com Mansueto Bernardi.  1925 – Em Alegrete, trabalhando na farmácia do pai (Pharmacia Quintana).  1926 – Morre a mãe (D. Virgínia); é premiado no concurso de contos do jornal Diário de Notícias de Porto Alegre (concorrendo com mais de 200 inscritos).  192...